Tudo sobre a mudança de nomes nas camisas da NBA

Ainda que a NBA demonstre ser, entre as grandes ligas esportivas, uma das que mais valoriza a opinião e as raízes sociais das suas estrelas, discursos como o “shut up and dribble” (“cale a boca e jogue” – frase da jornalista Laura Ingraham a LeBron James, em 2018) não são raros. Com a escalada da tensão racial nos EUA, especialmente após o assassinato de George Floyd, se tornou intensa a demanda dos jogadores pela permissão para se expressarem sobre as causas com as quais se identificam.
Na retomada da NBA, a liga anunciou que permitirá que os jogadores substituam o nome das costas de suas camisetas por uma mensagem de apoio a alguma causa social. Entretanto, essa mensagem não é totalmente livre. Foram definidas 29 opções:
Black Lives Matter | Justice Now | Ally |
Say Their Names | Say Her Name | Stand Up |
Vote | Sí Se Puede | Anti-Racist |
I Can’t Breathe | Liberation | I Am A Man |
Justice | See Us | Speak Up |
Peace | Hear Us | How Many More |
Equality | Respect Us | Group Economics |
Freedom | Love Us | Education Reform |
Enough | Listen | Mentor |
Power to the People | Listen to Us |
Naturalmente, a permissão acompanhada de uma limitação desagradou alguns jogadores. Jaylen Brown, do Boston Celtics, declarou estar “desapontado” e que gostaria de ter mais opções. Mike Scott, do Philadelphis 76ers, foi enfático: “não deram aos jogadores a oportunidade de manifestar sua opinião (…) apenas nos deram uma lista pra escolher”.
Essa lista nasceu de uma negociação entre a NBA, a NBPA (Associação de Jogadores) e a Nike, esta última com a missão de operacionalizar a produção e o transporte dos uniformes, seus números e letras – a estampa dos nomes, na prática, é realizada pelas próprias franquias.
As alterações valem apenas até o final da atual temporada e essas camisas não serão revendidas. A forma mais fácil de obter um desses uniformes será personalizando numa loja oficial da NBA (serviço que não é oferecido no Brasil).
Até a última quarta-feira (15), dos 350 jogadores que estão na bolha, 285 já haviam escolhido uma mensagem e 17 decidiram jogar com seus próprios nomes. O prazo para os atletas se manifestarem termina na segunda-feira (20). A mensagem mais escolhida até então é “Equality” (Igualdade, em português). Ela estará nas camisas de Luka Doncic, Chris Paul, Rudy Gobert, do atual MVP Giannis Antetokounmpo e de muitos outros jogadores. A segunda mensagem mais vezes escolhida é “Black Lives Matter” (Vidas Negras Importam).

Os jogadores estrangeiros poderão traduzir a mensagem para o seu idioma nativo. Jusuf Nurkic, do Portland Trail Blazers, fará a tradução para o bósnio. Segundo Marc J. Spears, há traduções programadas para o esloveno, italiano, francês, hebraico e… para o português! Os únicos critérios que os estrangeiros precisaram cumprir foram o limite de caracteres (16) e o uso de letras do alfabeto inglês.
Mudanças após o 4º dia
A proposta inicial era usar as mensagens apenas nos 4 primeiros dias de competição. A NBPA insistiu e conseguiu sustentar a manifestação até o final do campeonato. Na prática, o processo é o seguinte: os jogadores que desejarem vão escolher uma das mensagem para substituir seus nomes. Após o 4º dia de competição, o jogador pode voltar a usar o seu sobrenome acima do número. Se ele optar por manter a mensagem sobre a causa social, o seu sobrenome passará a aparecer abaixo do número.
LeBron James vai com seu próprio nome
A maior estrela da NBA atual não vai aderir aos nomes. Acima do número 23 dos Lakers veremos o tradicional “James”. O jogador, que sempre demonstra muita consciência sobre seu papel social, não aderiu à novidade: “Não é um desrespeito à lista (…) É apenas algo que não converge com a minha missão, com o meu objetivo”. Ele completa: “Eu acredito que posso fazer as duas coisas: levar alegria para muitas famílias com a forma que eu jogo e que os Lakers jogam e eu vou continuar me esforçando para provocar uma verdadeira mudança para as pessoas negras”.
Outras ações sociais
A NBA programou outras ações de cunho social para a retomada da temporada. Entre elas, o leilão das camisas utilizadas na noite de reabertura. O dinheiro arrecadado com esses leilões será destinado a um fundo administrado pela NBPA, que promove ações sociais por todo o EUA.
As mensagens escolhidas pelos jogadores estarão presentes apenas em suas camisas de jogo, mas eles também receberão casacos, camisetas e uniformes de aquecimento com mensagens como “Break the cycle” (Interrompa o ciclo). As laterais das quadras também serão personalizadas com a mensagem “Black lives matter”.
Na bolha de Orlando ainda há um canal de televisão com programação voltada a temas relativos à justiça social.
Opinião
Eu, absolutamente, compreendo os jogadores que ficaram insatisfeitos com os limites impostos pela liga. Por outro lado, entendo que mudanças como essa – dar visibilidade às causas que eles defendem – mexem na estrutura do esporte, mexem na quantidade de dinheiro que circula. E quando mexe no dinheiro, tudo é feito com muito cuidado.
Vejo essa permissão temporária como um passo significativo de um processo. Essas mudanças, em geral, são reformas, não revoluções. À medida que os jogadores continuarem se manifestando e que a liga ganhe com isso, que os atletas e franquias ganhem com isso e, mais importante, que os movimentos sociais se beneficiem, a tendência é que tenham cada vez mais espaço.
Sobre as camisas, acredito que seja uma episódio pontual, muito estimulado pela atual tensão racial e pelo encerramento atípico da temporada. Esse tipo de ação, em especial, não deve se repetir.
Casos similares no passado
A alteração proposta para o término da temporada 2019-20 é absolutamente sem precedentes. No entanto, quero destacar 3 episódios que se relacionam com mudanças de nomes nas camisas.
Antes de mais nada, é importante destacar que a NBA é extremamente rigorosa com o nome que os jogadores aplicam nas costas. Atualmente, o jogador precisa incluir o seu último sobrenome e alterações só são permitidas em casos especiais.
Um desses casos especiais aconteceu com o brasileiro Nenê. Registrado como Maybyner Rodney Hilário, o brasileiro estreia no Denver Nuggets em 2002 e joga sua temporada de calouro com o sobrenome Hilário nas costas. Em função da conotação negativa que a palavra hilário tem na língua portuguesa, o pivô conseguiu alterar legalmente o seu nome, passando a se chamar Maybyner Rodney Hilário Nenê. A partir da temporada 2003-04 – já com o rebrand dos Nuggets para azul e amarelo – a camisa do jogador era estampada com “Nenê”.
Um caso antigo, mas curioso, é o de Lloyd Bernard Free. Ele jogou na NBA entre 1975 e 1988, com temporadas sólidas por Clippers, 76ers, Cavaliers e Warriors. Foi nos Warriors que Lloyd tomou a decisão de alterar, legalmente, seu primeiro nome para “World”, apelido pelo qual era conhecido antes de jogar como profissional. O apelido era referência a uma enterrada com giro de 360° que Lloyd executava. Além disso, abreviando o nome do meio, World B. Free produzia o som de “world be free” (algo como “mundo seja livre”). Em uma época que a NBA era menos rigorosa com os nomes das camisas, ele conseguiu jogar até mesmo com o nome World acima do 21 do San Diego Clippers.

Mas, sem dúvida, o caso mais conhecido é o de Ron Artest. O polêmico e talentoso jogador foi outro que, no meio de sua carreira na NBA, alterou todos os docmentos e passou a se chamar Metta World Peace. O sobrenome “World Peace” significa “paz mundial”, numa tradução livre. Dessa forma, Metta pôde alterar também o nome de sua camiseta.
Essa não foi a única escolha excêntrica do jogador. O incomum número 37 de sua camisa era uma homenagem ao álbum Thriller, de Michael Jackson, por ter ficado 37 semanas em primeiro lugar nos rankings. Após a aposentadoria, alterou novamente seu nome. Atualmente se chama Metta Sandiford-Artest.
Categorias
Um comentário em “Tudo sobre a mudança de nomes nas camisas da NBA” Deixe um comentário ›